segunda-feira, 5 de maio de 2008

Livro: Mentes Inquietas - Entendendo Melhor o Mundo das Pessoas Distraídas, Impulsivas e Hiperativas

Autora: Ana Beatriz B. Souza.

Editora: Gente / São Paulo12ª Edição / 222 páginas.

De autoria de Ana Beatriz Barbosa Silva, médica com pós-graduação em psiquiatria pela UFRJ e especialização em Medicina do Comportamento pela Universidade de Chicago, Estados Unidos.Por ser uma obra densa e recheada de exemplos reais, colocarei aqui algumas coisas que me chamaram especial atenção numa visão geral deste livro.Pessoas com sintomas típicos como desatenção, desorganização e atabaolhamento, muitas vezes são vistas como não tendo jeito e muitas vezes levam uma vida soterrada por críticas e culpa. Mente Inquieta (cérebro com funcionamento DDA), não significa um cérebro defeituoso. Seu comportamento peculiar é responsável pelas suas melhores características, bem como suas maiores angústias. O livro aborda vários traços comportamentais de pessoas com mente inquieta. Citarei algumas:- Desvia a atenção por qualquer estímulo;- Dificuldade em prestar atenção na fala de outros;- Desorganização cotidiana;- Dificuldade com atividades obrigatórias de longa duração;- Interromper as tarefas no meio;- Tendência a estar sempre ocupado;- Costume de fazer várias coisas ao mesmo tempo;- Hipersensibilidade;- Instabilidade de humor;- Tendência ao desespero;- Depressões freqüentes entre outros.Para essas pessoas, é um desafio adequar-se ao ritmo não-elétrico dos outros. Um caso real que achei interessante foi de um Contador que sentia-se tolhido numa escada rolante.Para ele, escada rolante significava tortura, de forma que ele a subia normalmente. Uma vez que a escada se move, ele rapidamente chegava ao topo enquanto as pessoas aguardavam calmamente o movimento da escada.São traços que como diz a autora, podem ‘cair mal’ para quem precisa trabalhar em funções burocráticas, rotineiras ou repetitivas ao passo que é positivo para quem exercita a criatividade como compositor ou artista.Achei curiosa a abordagem da afetividade nessas pessoas: emoção em excesso e escassez de razão. São pessoas que amam intensamente no interior de suas mentes, mas não conseguem colocar em prática o que vivem em seus pensamentos. Muitas vezes, seus parceiros sequer imaginam que são objetos de tão nobres sentimentos. Felizmente toda essa emoção tende a transformar-se em poesias, obras literárias ou músicas. Semelhante a um vulcão inativo, a pessoa pode apresentar-se calma e tranqüila externamente, mas por dentro, mantém-se agitado e inquieto.A autora cita o nome de alguns famosos que apresentavam esses traços. Citarei alguns:Fernando Pessoa – Em sua obra há traços de inquietação, contradição, devaneios, dificuldade em seguir regras. (Como no poema “Liberdade”: Ai que prazer/ não cumprir um dever/ ter um livro pra ler/ e não o fazer...) Criou por isso vários ‘eus’, os heterônimos, indicando uma personalidade inquieta e de humor instável.Leonardo da Vinci – Uma mente movida por inquietação. Além de pintor, foi arquiteto, botânico, urbanista, cenógrafo, cozinheiro, inventor, geógrafo, físico e até músico. Deixou uma infinidade de obras inacabadas por começar vários projetos ao mesmo tempo, característica desse tipo de funcionamento mental.Ludwig Van Beethoven – Inquieto, polêmico e incompreendido. Era acometido de devaneios e distrações, segundo seus amigos. Produziu obras geniais sem escutá-las. Elas brotavam de sua mente inquieta, imune à sua surdez.Pessoas com este problema tem vulnerabilidade para desenvolver outros transtornos como TOC, Fobias, Pânico, Depressão, transtornos alimentares e de humor, para citar alguns.A autora dedica um capítulo ao maior desafio: a difícil tarefa de dormir bem e orienta como relaxar um cérebro a mil por hora. Em suma, Mentes Inquietas é um guia para quem apresenta esse funcionamento cerebral que mescla desafios vários com muita criatividade. A autora transmite uma visão otimista sobre o problema e uma variedade de recursos para tratamento. Tirei muito proveito desta leitura e por isso a recomendo.

Sandra Lima Costa Melo
Publicado no Recanto das Letras em 25/02/2008

Trecho do livro: Resolvemos elaborar, com base empírica advinda da experiência clínica, uma tabela com cinqüenta critérios sugeridos para DDA na população adulta. Procuramos, dentro do que foi possível, buscar critérios relacionados com a vida cotidiana, visando facilitar a auto (de si próprio) e/ou hetero (do outro) identificação, bem como seu entendimento prático. Ao ler a lista a seguir, considere a freqüência e a intensidade com as quais as situações ocorrem e pense na possibilidade de caracterizar um funcionamento DDA se, pelo menos, trinta e cinco das opções forem positivas. Cabe destacar, ainda, que a lista foi subdividida em quatro grandes grupos para enfatizar situações decorrentes dos sintomas primários do DDA (desatenção, hiperatividade e impulsividade), bem como situações secundárias, ou seja, aquelas que quase sempre aparecerão como consequência do próprio “desgaste” do cérebro DDA e das dificuldades crônicas enfrentadas por essas pessoas nos diversos setores de suas vidas afetiva/familiar, social e profissional.

1º Grupo: Instabilidade da atenção:

1. Desvia facilmente sua atenção do que está fazendo, quando recebe um pequeno estímulo. Um assobio do vizinho é suficiente para interromper uma leitura.
2. Tem dificuldade em prestar atenção à fala dos outros. Numa conversa com outra pessoa tende a captar apenas “pedaços” soltos do assunto.
3. Desorganização cotidiana. Tende a perder objetos (chaves, celular, canetas, papéis), atrasar-se ou faltar a compromissos, esquecer o dia de pagamento das contas (luz, gás, telefone, seguro).
4. Freqüentemente apresenta “brancos” durante uma conversa. A pessoa está explicando um assunto e no meio da fala esquece o que ia dizer.
5. Tendência a interromper a fala do outro. No meio de uma conversa lembra de algo e fala sem esperar o outro completar seu raciocínio.
6. Costuma cometer erros de fala, leitura ou escrita. Esquece uma palavra no meio de uma frase ou pronuncia errado palavras longas como “cineangiocoronariografia”.
7. Presença de hiperfoco (concentração intensa em um único assunto num determinado período). Um DDA pode ficar horas a fio no computador sem se dar conta do que acontece ao seu redor.
8. Dificuldade de permanecer em atividades obrigatórias de longa duração. Participar como ouvinte de uma palestra em que o tema não seja motivo de grande interesse e não o faça entrar em hiperfoco.
9. Interrompe tarefas no meio. Um DDA freqüentemente não lê um artigo de revista até o fim, ou ouve um CD inteiro.

2º Grupo: Hiperatividade física e/ou mental:

10. Dificuldade em permanecer sentado por muito tempo. Durante uma palestra ou sessão de cinema costuma mexer-se o tempo todo na tentativa de permanecer em seu lugar.
11. Está sempre mexendo com os pés ou as mãos. São os indivíduos que têm os pés “nervosos”, girando suas cadeiras de trabalho, ou que estão sempre com suas mãos ocupadas, pegando objetos, desenhando em papéis ou ainda ajeitando suas roupas ou seus cabelos.
12. Constante sensação de inquietação ou ansiedade. Um DDA sempre tem a sensação de que tem algo a fazer ou pensar, de que alguma coisa está faltando.
13. Tendência a estar sempre ocupado com alguma problemática em relação a si ou com os outros. São as pessoas que ficam “remoendo” sobre suas falhas cometidas, ou ainda sobre os problemas de amigos ou conhecidos.
14. Costuma fazer várias coisas ao mesmo tempo. É a pessoa que lê e vê TV ou ouve música simultaneamente.
15. Envolve-se em vários projetos ao mesmo tempo. Um exemplo é a pessoa que tem várias idéias simultaneamente e acaba por não levar a cabo nenhuma delas em função desta dispersão.
16. Às vezes se envolve em situações de alto risco em busca de estímulos fortes, como dirigir em alta velocidade.
17. Freqüentemente fala sem parar, monopolizando as conversas em grupo. É a pessoa que fala sem se dar conta de que as outras estão tentando emitir suas opiniões (além de não se dar conta do impacto que o conteúdo do seu discurso pode estar causando a outras pessoas).

3º Grupo: Impulsividade:

18. Baixa tolerância à frustração. Quando quer algo não consegue esperar, se lança impulsivamente numa tarefa, mas, como tudo na vida requer tempo, tende a se frustrar e desanimar facilmente.
19. Costuma responder a alguém antes que este complete a pergunta. Não consegue conter o impulso de responder ao primeiro estímulo criado pelo início de uma pergunta.
20. Costuma provocar situações constrangedoras, por falar o que vem à mente sem filtrar o que vai ser dito. Durante uma discussão, um DDA pode deixar escapar ofensas impulsivas.
21. Impaciência marcante no ato de esperar ou aguardar por algo. Filas, telefonemas, atendimento em lojas ou restaurantes podem ser uma tortura.
22. Impulsividade para comprar, sair de empregos, romper relacionamentos, praticar esportes radicais, comer, jogar etc. É aquela pessoa que rompe um relacionamento várias vezes e volta logo depois, arrependida.
23. Reage irrefletidamente às provocações, críticas ou rejeição. É o tipo
de pessoa que explode de raiva ao sentir-se rejeitada.
24. Tendência a não seguir regras ou normas preestabelecidas. Um exemplo seria o trabalhador que teima em não usar equipamentos de segurança, apesar de saber da importância destes.
25. Compulsividade. Na realidade a compulsão ocorre pela repetição constante dos impulsos, os quais, com o tempo, passam a fazer parte da vida dessas pessoas, como as compulsões por compras, jogos, alimentação etc.
26. Sexualidade instável. Tende a apresentar períodos de grande impulsividade sexual alternados com fases de baixo desejo.
27. Ações contraditórias. Um DDA é capaz de ter uma explosão de raiva por causa de um pequeno detalhe (por mexerem em sua mesa de trabalho, por exemplo) numa hora e, poucos momentos mais tarde, ser capaz de uma grande demonstração de afeto, através de um belo cartão, flores ou um carinho explícito. Ou ainda ser um homem arrojado e moderno no trabalho e, ao mesmo tempo, tradicional e conservador no âmbito familiar e afetivo.
28. Hipersensibilidade. O DDA costuma melindrar-se facilmente. Uma simples observação desfavorável sobre a cor de seus sapatos é suficiente para deixá-lo internamente arrasado, sentindo-se inadequado.
29. Hiper-reatividade. Essa é uma característica que faz com que o DDA se contagie facilmente com os sentimentos dos outros. Pode ficar profundamente triste ao ver alguém chorar, mesmo sem saber o motivo, ao mesmo tempo que pode ficar muito agitado ou irritado em ambientes barulhentos ou em presença de multidão.
30. Tendência a culpar os outros. Um DDA muitas vezes poderá culpar outra pessoa por seus fracassos e erros, como o aluno que culpa o colega de turma por ter errado em uma questão da prova, já que este colega estava cantarolando baixinho na hora.
31. Mudanças bruscas e repentinas de humor (instabilidade de humor). O DDA costuma mudar de humor rapidamente, várias vezes no mesmo dia, dependendo dos acontecimentos externos ou ainda do seu estado cerebral, uma vez que o cérebro do DDA pode entrar em exaustão, prejudicando a modulação do seu estado de humor.
32. Tendência a ser muito criativo e intuitivo. O impulso criativo do DDA é talvez a maior de suas virtudes. Pode se manifestar nas mais diversas áreas do conhecimento humano.
33. Tendência ao “desespero”. Quando um DDA se vê diante de uma dificuldade, seja ela de qualquer ordem, ele tende a vê-la como algo impossível de ser transposto e com isso sente-se tomado por uma grande sensação de incapacidade. Sua primeira reação é o “desespero”. Só mais tarde consegue raciocinar e constatar o verdadeiro “peso” que o problema tem. Isso ocorre porque seu cérebro apresenta dificuldade em acionar uma parte da memória chamada funcional, cujo objetivo é trazer à mente situações vividas no passado e utilizá-las como instrumentos capazes de ajudar a encontrar saídas para as mais diversas problemáticas.

4º Grupo: Sintomas secundários:

34. Tendência a ter um desempenho profissional abaixo do esperado para a sua real capacidade.
35. Baixa auto-estima. Em geral o DDA sofre desde muito cedo uma grande carga de repreensões e críticas negativas. Sem compreender o porquê disso, ele tende, com o passar do tempo, a ver-se de maneira depreciativa e passa a ter como referência pessoas externas e não ele próprio.
36. Dependência química. Pode ocorrer como conseqüência do uso abusivo e impulsivo de drogas durante vários anos.
37. Depressões freqüentes. Ocorrem em geral por uma exaustão cerebral associada às frustrações provenientes de relacionamentos malsucedidos e fracassos profissionais e sociais.
38. Intensa dificuldade em manter relacionamentos afetivos, conforme será visto na parte referente à dificuldade afetiva dos DDAs.
39. Demora excessiva para iniciar ou executar algum trabalho. Tais fatos ocorrem pela combinação nada produtiva de desorganização aliada a uma grande insegurança pessoal.
40. Baixa tolerância ao estresse. Toda situação de estresse leva a um desgaste intenso da atividade cerebral. No caso de um cérebro DDA esse desgaste apresentar-se-á de maneira mais marcante.
41. Tendência a apresentar um lado “criança” que aparecerá, por toda a vida, na forma de brincadeiras, humor refinado, caprichos pensamentos mágicos e intensa capacidade de fantasiar fatos e histórias.
42. Tendência a tropeçar, cair ou derrubar objetos. Isso ocorre em função da dificuldade do DDA de concentrarse nos atos e de controlar ou coordenar a intensidade de seus movimentos.
43. Tendência a apresentar uma caligrafia de difícil entendimento.
44. Tensão pré-menstrual muito marcada. Ao que tudo indica, em função das alterações hormonais durante esse período, que intensificam os sintomas do DDA. A retenção de líquido que ocorre durante os dias que antecedem a menstruação parece ser um dos fatores mais importantes.
45. Dificuldades em orientação espacial. Encontrar o carro no estacionamento do shopping quase sempre é um desafio para um DDA.
46. Avaliação temporal prejudicada. Esperar por um DDA pode ser algo muito desagradável, pois em geral sua noção de tempo nunca corresponde ao tempo real.
47. Tendência à inversão dos horários de dormir. Em geral adormece e desperta tardiamente, por isso alguns deles acabam viciando-se em algum tipo de hipnótico.
48. Hipersensibilidade a ruídos, principalmente se repetitivos.
49. Tendência a exercer mais de uma atividade profissional, simultânea ou não.

E, finalmente, o último critério, que não se enquadra em nenhum dos quatro grupos de sintomas, mas tem sua relevância confirmada pelos estudos que apontam participação genética marcante na gênese do DDA:

50. História familiar positiva para DDA.