quinta-feira, 24 de dezembro de 2009

Dia 24

Provas de final de semestre, apresentações, pré-projeto de monografia, e finalmente estou de férias. Consegui passar por estes obstáculos sem nenhuma baixa. Infelizmente não posso dizer o mesmo da minha entrevista de emprego. Muita ansiedade, medo, pensamentos negativos, e a sensação de não poder fracassar. Os processos seletivos parecem um jogo de vídeo game, na última fase você sempre enfrenta o pior adversário. Depois de muitas torturas psicológicas, consegui chegar até o “mestre”. Fui recebido pelo gerente do hospital numa entrevista cara a cara, mas que não rendeu frutos. Provavelmente a loira bonita e gostosa que também esperava para ser entrevistada conseguiu a vaga. Todos os dias penso na minha vida, nos meus problemas, e em tudo o que acontece ao meu redor. Sei que o caminho é continuar tentando, mesmo que algumas vezes eu acorde com vontade de fugir para outra dimensão. Um lugar que não exista medicamentos, melancolia, pensamentos negativos, ansiedade, medo, raiva, e tantos obstáculos para enfrentar. Sei que a vida é mais dura para quem não consegue, ou tem dificuldades, em vê-la pelo lado positivo. Talvez eu deveria ser como meu vizinho. Ele tem uma mulher feia, ganha mal, ouve funk todos os finais de semana, mas parece ser tão feliz. Pelo menos está rindo o tempo todo. Continuo engolindo meus comprimidos, indo na psicoterapia, e tentando... Vou tatuar alguma frase de efeito no meu braço, olharei para ela todas as vezes que eu pensar em me trancar num quarto escuro. Se as minhas três crises depressivas, e os meus dez anos de diagnóstico de transtorno de humor me deram alguma "sabedoria” sobre a forma como meus pensamentos influenciam a minha vida, eu só não consigo responder a uma pergunta: O que me dá prazer? Todos precisam de algo que os façam rir de vez em quando, que sirva de compensação, o “ouro dos tolos”. Meu orkut está repleto de pessoas que registraram presença em diferentes épocas de minha vida. Quando eu dava aulas em academias, no meu último trabalho como enfermeiro, colegas da escola primária, da faculdade, amigos de infância, etc. Muitos rostos, poucas palavras. Todos ficaram para trás. Parece que as companhias só estão ao seu redor quando o copo está cheio, e o riso se faz presente.

“Ria e o mundo rirá com você. Chore e você chorará sozinho”.
Shakespeare

Eu precisava registrar algo no meu blog, depois de tanto tempo sem escrever. Hoje não deixarei mensagens de otimismo, dicas de como conviver com a doença, técnicas de psicoterapia, novidades com medicamentos, etc. Algumas vezes eu faço isso, mas não será hoje. Ao menos aqui eu posso ser eu mesmo. Sem máscaras, ou atuações. Não estou bem. Não importa se a árvore de Natal seja alegre e toda colorida, ou se há um presépio armado na estante da sala mostrando o nascimento de Jesus. Nada disso fará diferença se eu não encontrar a resposta que eu procuro. E se ela não existir, terei que pensar em algo.A vida é muito breve.

terça-feira, 22 de dezembro de 2009

Monologo de Segismundo



Ai miserável de mim e infeliz!
Apurar, ó céus, pretendo,
já que me tratais assim,
que delito cometi
contra vós outros, nascendo;
que, se nasci, já entendo
qual delito hei cometido:
bastante causa há servido
vossa justiça e rigor,
pois que o delito maior
do homem é ter nascido.

E só quisera saber,
para apurar males meus
deixando de parte, ó céus,
o delito de nascer,
em que vos pude ofender
por me castigardes mais?
Não nasceram os demais?
Pois se eles também nasceram,
que privilégios tiveram
como eu não gozei jamais?

Nasce a ave, e com as graças
que lhe dão beleza suma,
apenas é flor de pluma,
ou ramalhete com asas,
quando as etéreas plagas
corta com velocidade,
negando-se à piedade
do ninho que deixa em calma:
só eu, que tenho mais alma,
tenho menos liberdade?

Nasce a fera, e com a pele
que desenham manchas belas,
apenas signo é de estrelas
graças ao douto pincel,
quando atrevida e cruel,
a humana necessidade
lhe ensina a ter crueldade,
monstro de seu labirinto:
só eu, com melhor instinto,
tenho menos liberdade?

Nasce o peixe, e não respira,
aborto de ovas e lamas,
e apenas baixel de escamas
por sobre as ondas se mira,
quando a toda a parte gira,
num medir da imensidade
co'a tanta capacidade
que lhe dá o centro frio:
só eu, com mais alvedrio,
tenho menos liberdade?

Nasce o arroio, uma cobra
que entre as flores se desata,
e apenas, serpe de prata,
por entre as flores se desdobra,
já, cantor, celebra a obrada natura em piedade
que lhe dá a majestade
do campo aberto à descida:
só eu que tenho mais vida,
tenho menos liberdade?

Em chegando a esta paixão
um vulcão, um Etna feito,
quisera arrancar do peito
pedaços do coração.
Que lei, justiça, ou razão,
nega aos homens - ó céu grave!
privilégio tão suave,
exceção tão principal,
que Deus a deu a um cristal,
ao peixe, à fera, e a uma ave?"

MONÓLOGO DE SEGISMUNDO
(LA VIDA ES SUEÑO, Ato I, Cena I) de Pedro Calderón de la Barca

sexta-feira, 4 de dezembro de 2009

Sexta-Feira

19:30h Sexta-Feira – Depois de 20 horas sentado numa das poltronas do salão de eventos de um hospital escola, finalmente chega ao fim o curso de dois dias sobre dependência química. Durante este período ouvi tudo o que meus ouvidos agüentaram sobre redução de danos, centros de assistência psicossocial, legislação sobre drogas, políticas publicas, etc. Agora estou pronto para mudar o mundo, só me falta um emprego. Este detalhe me incomoda muito, e cada vez mais não deixo de atribuir a ele parte do meu mau humor de fim de ano. Apesar do cansaço pela maratona, estou distante de casa, e preciso esperar um pouco mais antes de ir embora, o metro está completamente lotado neste horário transportando milhares de pessoas que retornam ao lar após um dia de trabalho. São mais de vinte estações até a minha casa, mais de uma hora de viagem caso o percurso fosse feito de ônibus. Sem uma idéia melhor, resolvo caminhar um pouco pelas proximidades do hospital através da avenida paulista e rua augusta seguindo até o centro da cidade. Vou matando o tempo, e observando a paisagem e a “fauna” urbana. Não recebi nenhuma intimação via celular até o momento, não tenho namorada ou esposa me esperando em casa. Nenhum plano mirabolante para o final de semana, na verdade pensar sobre a vida me faz mal. Preciso olhar a paisagem, tirar as obsessões da cabeça. Se a paulista se destaca pelos imponentes edifícios e agencias bancárias com as decorações natalinas típicas desta época do ano, pela rua augusta o contraste fica a cargo dos cafés, restaurantes, bares, danceterias, boates e “inferninhos” exibindo cartazes de mulheres seminuas ao longo da rua. Aos poucos, em plena sexta-feira, as calçadas são tomadas por mesas e cadeiras em frente aos bares que ficarão lotadas de freqüentadores em busca de bebida e diversão, nas esquinas e travessas são as prostitutas com roupas ousadas que se destacam. São elas que contribuem para tornar a rua famosa, e sinceramente eu não acredito que consigam retira-las mesmo com a reforma cultural e a revitalização que estão propondo. Paro num café para beber algo, e vejo uma garota surpreendendo um rapaz com um beijo. Por alguns minutos fico com inveja, tento me lembrar da última vez que isso me aconteceu, e acabo lembrando de coisas que deveria ter deixado para trás Estou muito sensível nestes dias. Culpa do final de ano, da troca do meu medicamento, do desprezo que sofro por parte da minha filha, dos amigos que aos poucos se foram, da falta de emprego, e da minha terapeuta que acredita que eu deva ingressar no funcionalismo público, pois sendo um paciente psiquiátrico existe a possibilidade das crises tornarem minha permanência num emprego comum impossível. Minha família que deseja que eu estampe um sorriso na cara, e passe o final de ano socado num apartamento alugado na praia com outras dez pessoas fingindo ser feliz. Penso nos esforços sem resultados, na pós que me decepciona e suga a grana que peguei emprestado, nas entrevistas sem retorno, nas minhas estratégias falhas. Tenho vontade de raspar a cabeça, cortas os pulsos, beber, fumar, ou fazer algo que alivie meus sentimentos. Respiro fundo e tento manter a imagem, lembro do mantra “cada um com seus problemas” que aprendemos desde cedo na vida. Na rua augusta pessoas animadas e coloridas chegam para a diversão, outras sérias ainda retornam para casa, ou permanecem impacientes no ponto de ônibus. Parece que todos têm uma missão nesta vida. Termino minha bebida de gosto amargo e sigo o meu caminho. Mais dez minutos e estarei no metro República, depois são doze estações até minha casa. Sorria e finja que está tudo bem. Todos esperam isso de você, e a vida segue. Até o dia em que você liga a tv e se depara com um noticiário anunciando que alguém entrou atirando numa repartição pública, e depois acabou com a própria vida, ou que um garoto tornou reféns alguns colegas do seu colégio com uma arma em punho. Pronto! A bomba relógio explodiu. O monstro que crescia silenciosamente vazou pelos poros. O cidadão exemplar mostrou sua verdadeira face. Quantos monstros existem por ai?  Por quanto tempo você amontoa seus sentimentos ruins em algum canto da mente? Por quanto tempo você consegue apenas sorrir e fingir que está tudo bem?

Agora eu sei

Zero – Kiko Zambianchi

Há muito tempo eu ouvi dizer,
Que um homem vinha pra nos mostrar
Que todo mundo é bom e que ninguém é tão ruim
O tempo voa e agora eu sei
Que só quiseram me enganar
Tem gente boa que me fez sofrer,
Tem gente boa que me faz chorar

Agora eu sei, e posso te contar,
Não acredite se ouvir também, que alguém te ama,
E sem você não consegue viver
Quem vive mente mesmo sem querer
E fere o outro, não pelo prazer,
Mas pela evidente razão, sobreviver,

Não é possível mais ignorar,
Que quem me ama me faz mal demais
Mas ainda é cedo pra saber,
Se isto é ruim ou é muito bom

O tempo voa e agora eu sei
Que só quiseram me enganar
Tem gente boa que me fez sofrer,
Tem gente boa que me faz chorar

Quem vê seu rosto só pensa no bem,
Que você pode fazer a quem
Tiver a chance de te possuir

Mal sabe ele como é triste ter
Amor demais, sem nada receber,
Que possa compensar, o que isto traz de dor

Tudo isto me traz de dor
O que isto traz de dor
Tudo isto me traz de dor
O que isto traz de dor