sábado, 29 de agosto de 2009

Eu sou Icaro


Quando comecei a escrever este site, minhas pretensões se resumiam em relatar a vida de um bipolar com todas as suas possibilidades, frustrações, realizações e preconceitos que giram ao redor desta doença. Da sanidade à beira da psicose, do surto, dos limites, dos extremos, da automutilação, das ideações suicidas, dos tratamentos, dos relacionamentos, das fases de negação, de aceitação, etc. Com o passar do tempo, Icaro tornou-se o que há de mais autentico em mim, expressando meus sentimentos sem medo, vergonha, ou receio. Sendo Icaro mostro minha verdadeira face, mostro quem realmente sou, sem máscaras ou disfarces. Através do teclado vou dedilhando minhas idéias, no monitor meus pensamentos tomam forma. Eu que vivo de forma condicionada no mundo real, sou obrigado a anular-me ao máximo, a esconder a minha verdadeira identidade. Não preciso descrever todo preconceito que existe sobre os distúrbios psiquiátricos, por mais esclarecida que sejam as pessoas, mesmo ao lado de profissionais da área da saúde existem os estigmas.

      Todo mundo é capaz de dominar uma dor, exceto quem a sente.
      William Shakespeare

      A insanidade, a instabilidade emocional, o romper com a realidade é permitido apenas para algumas pessoas como atores de novelas, artistas famosos, ou pessoas de status. Todos aceitam naturalmente que as tais pessoas citadas venham a público e confessem que sejam bipolares, depressivos, dependentes químicos, etc. Justificando alguns excessos, atitudes excêntricas, desastres pessoais... Parece até que isso lhes atribuem uma espécie de “qualidade” adicional, de salvo conduto para caírem quando quiserem. Quantas vezes esta ou aquela figurinha apareceu diante da mídia justificando seus atos com tais argumentos, prometendo recuperar-se, ou ainda sendo internado pela terceira ou quarta vez sem que alguém ficasse admirado, ou chocado?
Como muitos torcem para que ela se recupere, ou ainda continue sendo matéria para vender jornais e revistas?  Se isso acontece com seu vizinho, colega de trabalho, ou amigo, provavelmente torna-se motivo fofocas, de comentários maldosos que chegam antes de qualquer explicação dada por esta pessoa. O cara passa o resto de sua existência com uma espécie de tatuagem na testa, um rótulo a ser citado por aqueles que se ocupam em relatar aos menos informados o infortúnio que esta pessoa carrega. E quanto à recuperação? Parece que não há a possibilidade de uma recuperação, de um equilíbrio, por mais delicado que seja. Todos esperam que um alcoolista volte a beber, que um bipolar caia novamente numa crise depressiva ou maníaca, que alguém com síndrome de pânico tome a atenção com seu desespero. A desgraça é aguardada com ansiedade. Embora a história tenha registrado inúmeros escritores, artistas, filósofos, pintores, pessoas nos mais diversos segmentos da sociedade que foram bipolares e que contribuíram para um mundo melhor. O preconceito ainda existe. Continuarei atuando até quando não puder mais. Serei o que esperam que eu seja, se minha dor for insuportável tratarei de esconde-la, ou demonstra-la apenas para aqueles que me amam de verdade e estão ao meu lado. Inevitavelmente um dia serei Icaro em tempo integral, mas por enquanto...